Era uma noite escura
e tempestuosa.
As ruas estavam desertas. O silencio predominava pela
minha cidade. Eu caminhava no passeio preto e branco, em direcção à praia. Não
sei bem porque, mas a saudade daquela paisagem era grande, posso até dizer
imensa. Perguntei à Leonor se queria vir comigo, chamou-me maluca mas não
percebi bem o porquê. Eu só queria regressar àquele lugar, naquele momento,
naquela circunstância.
Ainda era um bocado longe mas não me apeteceu pegar no
carro. Queria percorrer aquele percurso como fazia antes, talvez para matar a
saudade que pensava que já estava extinta há bastante tempo.
As montras ainda me fascinavam, a minha loja favorita
continuava igual. Estranho mas, não sabia há quanto tempo não passava ali, não
me lembrava da última vez que os meus olhos tinham brilhado para aqueles
vestidos que me fascinavam.
As memórias do passado feliz estavam a regressar à
minha cabeça, estavam a fazer-me sorrir sem algum motivo aparente.
Os becos sem saída que se aproximavam, sempre tiveram
ar sinistro e sobrenatural. Passei, olhei para o outro lado da estrada,
preferia não olhar do que ver como eram novamente.
De repente, quando olhei para a frente, algo passou
entre as minhas pernas. Assustei-me. Olhei instintivamente para trás mas não vi
nada. Asselarei o passo aterrorizada e o meu coração batia cada vez mais
depressa.
O odor do mar já se sentia no ar mas eu sentia-me
perseguida. Parecia-me ouvir a respiração de alguém mas, sempre que olhava para
trás, não estava lá nada. O frio parecia aumentar mas, cada vez me incomodava
menos, talvez devido ao medo e receio que estavam em mim naquele momento ou ,
talvez porque já via a praia.
Fui andando até que cheguei. Pus-me em pé em cima de
um corrimão azul mal pintado, que sempre tinha sido assim. Abri os braços. O
meu casaco vermelho esvoaçava com o vento e as minhas pernas estavam a fazer um
esforço para se aguentarem. O meu cabelo castanho e louro devia estar todo
despenteado mas, eu sentia-me tão bem.
Sentei-me na areia e descalcei-me. Olhei para trás,
num movimento reticente, com medo daquilo que lá pudesse estar visto que a
praia estava completamente deserta. Vi uns pés.
Levantei-me num salto, e arregalei os meus olhos
simples de cor, pus a mão à frente da boa e fiquei a olhar para aquilo que
estava ali comigo. Custava-me aceitar que aquilo me estava a acontecer, a minha
mente não estava a acreditar e comecei a pensar que a Leonor tinha razão,
estava a ficar maluca.
Não era possível. Como é que ele tinha dado pela minha
falta em casa? Andava tão atarefado nos últimos tempos que nem tinha tido tempo
para me dar atenção. Não reparava como é que estava vestida, não dizia que eu
estava bonita. Nada, nos últimos tempos era assim.
- Assustaste-me ! O que é que estás aqui a fazer? –
disse.
- Vim ver o que andavas a fazer. Afinal de contas
ainda és da minha responsabilidade. Já para casa!
Começou a chover. Eu não queria acreditar que ele
estava a falar daquela maneira comigo.
- Não ! Apetece-me ficar aqui.
Nesse momento deu-me um estalo. Estava diferente, via
a raiva nos seus olhos. Agarrei nos meus sapatos, virei-lhe costas e comecei a
correr em direcção ao mar. Ele chamou-me mas eu não liguei, virei à direita e
corri até me cansar.
O meu cabelo estava encharcado e o meu casaco vermelho
tinha mudado de cor. Parei porque já não aguentava mais de cansaço e, olhei
para o mar.
Seria tudo aquilo verdade ou seria simplesmente um
sonho do qual eu queria acordar ?
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